sábado, 20 de outubro de 2018

Poexilhado

O barco quebrou.
O pó espalha por toda parte.
O poeta se isolou.
Resolveu abdicar de sua arte.

Partiu a nado,
Vendo o nada.
Procurando o nunca encontrado.
Seu antigo conto de fada.

Sem pulmão,
Cuspindo de tripas a coração,
Se agarra a um pedaço de terra.
Era uma utopia. Ele berra.

Ilhado, pirado e revoltado,
Temos um poeta exilado.
Não há nada nem ninguém ao lado.
Eis mais um louco, enjaulado.

terça-feira, 9 de outubro de 2018

Paciência

Tudo tão complexo.
Tudo tão incompleto.
O céu não tem mais águias.
Elas são urubus, de perto.

A sanidade parece escapar.
Parece se perder nesta cidade.
Mas em todo lugar, tem esse ar,
Escasso de luminosidade.

Ouço os pássaros a cantar.
De novo.
Isso deveria ser bom sinal.
Mas eu já saí do meu ovo.

Não posso me comunicar.
A aflição me persegue.
Desistir, não é aceitar.
Por isso é vida que segue.

Auto-destruição.
Talvez tenha inventado uma palavra.
Mas não entro em contradição,
Com o que está em minha alma.

De que adianta,
As flores serem vermelhas,
E as violetas azuis,
Se não encontro nem a cura da essência,
Da minha alma sem luz?

Preciso da decisão.
Preciso enfrentar meu medo.
Preciso ser crucificado,
Para saber que ainda é cedo.

Preciso sofrer.
Precisa doer.
Pois só assim vou saber,
Que minha mente não vai perecer.

Preciso ser forte.
Talvez seja ego.
Preciso de um norte.
Mesmo que esteja cego.

Hoje estou sem calcanhar.
Também estou sem paladar.
O tato, só no sonhar.
E o olfato… está a aguçar.

Tenho medo de quem sou.
Medo da persona que forjaram.
Medo do que se instalou.
Do que me foi ordenado.

Mas que viva seu reinado!
Minha vontade, não importa.
Ela destrói meu chamado,
Tranca a minha porta.

Só existem duas.
A do amadurecimento,
E a da morte.
Para essa escolha, não quero depender da sorte.

Tenho uma pássara em minha vida.
Talvez mais uma palavra inventada.
Mas ela vem repondo a minha saliva,
Com sua verdade emancipada.

Sinto-me grato.
Mesmo com todos os pesares.
Tenho pessoas pra contar e um gato,
O que me deixa estupefato.

Me sinto ruim.
Me sinto mal.
Sinto que vou para o inferno,
Sem nem chance de umbral.

E mesmo assim,
Mesmo me sentindo assim,
Tenho quem me ame,
E tenho quem zela por mim.

Talvez, se não fosse assim,
Meu fim estaria claro como marfim.
Mas eles estão alí.
Me segurando para não cair.

“Um cigarro atrás do outro
Eu fumo sem parar”
Era sobre paixão.
Meu caso é a tentativa de selar.

Selar a ansiedade.
Abafar o medo.
Entender que a atrocidade,
Só existe em meu pesadelo.

Acordar gritando.
Tá aí uma coisa simbólica.
Não gritamos sonhando.
Só quando isso vem para nossa área cósmica.

O momento de acordar.
De sufocar na própria mente.
Passa. É só acreditar,
E lembrar que a mente mente.

Sensações falsas.
Situações impossíveis.
Trazem emoções rasas,
Mas inconfundíveis.

Só quem sente sabe.
Só em quem sentiu, cabe.
É um entendimento da pura dor.
Mas de nenhuma forma, superior.

Isso não me torna mais sábio.
Isso não me torna mais hábil.
Faz com que escrever seja sobrevivência.
Seja a própria fuga da demência.

Pois ver tanta maldade,
Vivenciar tanta atrocidade,
Faz-nos ver o mundo com menos liberdade,
E mais opacidade.

Independente da cidade,
O alarde é igual.
Perder a sanidade,
Passou a ser uma possibilidade real.

Quando pivete,
Fazia preces por liberdade.
Para poder alterar a consciência,
Sem culpa e sem maldade.

Mas foi um caminho errado.
A sanidade é essencial.
Hoje meu pássaro é calado.
Um dia ele já foi especial.

Escrevo para viver.
Escrevo para sobreviver.
Escrevo para não morrer.
Escrevo para não enlouquecer.

Não é dom nem opção.
Não tem a ver com pensar na recompensa do amanhã.
Tem a ver com o coração,
E com manter a mente sã.

Beber é bom.
Contraditório, não?
Talvez poetas de alma,
Precisem de uma inspiração.

Eu odeio isso.
E odeio odiar isso.
Fica nisso…
Sempre nisso…

Mas há de haver uma mudança.
Nem que eu a chame de “espiritual”.
Vou ter que entrar nessa dança,
Junto com meu “eu” celestial.

Não quero parar de escrever.
Talvez esse poema já tenha chegado ao fim.
Mas tenho muito a dizer.
EU ainda não cheguei ao fim.

Sempre me importei com a estética.
E em não deixar o poema muito grande.
Me preocupei com a métrica e a fonética,
Para tentar parecer grande.

Mas então qual a motivação de escrever?
Se faço para manter a sanidade,
Porque moldar para vocês?
Que conheçam a minha verdade!

Me importo com a rima.
Me importo com o que vão pensar.
Quero meu livro no topo,
De toda estante de sala de estar.

Quero reconhecimento.
Por apenas sobreviver.
A ironia de tudo isso,
É que não sei como fazer.

Venho fazendo.
Venho sobrevivendo.
Venho sonhando,
Venho planejando,

Mas só venho.
Não vou.
O medo me para.
Eu sempre me contenho.

Conheço meu potencial.
Sei que sou manipulador.
Mas não quero usar isso no meu pessoal,
Nem muito menos para aliviar a dor.

Então, senhor,
Apelo a ti.
Clamei mil vezes, sentindo o ardor,
E nenhum alívio recebi.

Será que sou pagão demais?
Será que não mereço sua paz?
Será que os espíritas estão certos?
Que o karma é explicação pra tudo que tem por perto?

Não aceito.
Não consigo aceitar.
Eu só queria liberdade.
Pra que me encarcerar?

Como se não bastassem as grades físicas,
Vieram as grades mentais.
Mas saiba que farei de tudo,
Para assassinar esse capataz.

Estou sozinho.
Fisicamente sozinho.
Mas algo me acompanha.
Algo que apanha por mim.
Que me guia o caminho.

Tenho promessas a cumprir.
Tenho que formar o indivíduo que prometi.
Não vou desistir.
Covardia eu não herdei. Não vou sumir.

Vão ter que me aturar.
Mesmo que somente eu leia esta bosta.
Isso só vai servir pra quem se interessar,
E quem se interessa não gosta.

“O que restou pra quem só faz poesia?”
Qual o mérito de ser escravo da nostalgia?
Talvez um dia eu encontre a resposta.
Talvez me torne alguém um dia.

Alguém conhecido, influente.
Admirado, por vencer seus traumas.
Pra mim já seria suficiente,
Saber que ajudei algumas almas.

Por hora é utopia.
Não passo de um vendedor.
Quem sabe um dia,
Possam me ver como doutor.

Sem CRM.
Sem nenhum diploma.
Apenas consciente,
E longe da obscura lona,

Que cega meus olhos,
Que obstrui minha visão.
Que me transforma em um zumbi,
Acostumado com a escuridão.

Não posso aceitar.
Não posso sucumbir.
Se é apenas um sonho,
Preciso acordar e subir.

Ou vou me perder.
Me perder na escuridão.
Por mais que a conheça bem,
Ela tem sua podridão.

Ela é falsa.
Ela engana.
Traz a tona um falso sol,
Cheio de luz profana.

E assim caminhamos.
Em direção ao que achamos certo.
Quando na verdade encontramos,
Todos os demônios de perto.

Conversamos com eles.
Interagimos com eles.
Nos divertimos com eles.
Até que nos tornamos um deles.

A canela seca e ralada,
Que vi hoje exposta no meio fio,
É reflexo do que temos exposto,
Em nosso caro museu frio.

Eles precisam deles.
Urubus comem carniças.
As pessoas estão morrendo do nosso lado,
E passamos como se fossem peças postiças.

Pedem dinheiro.
Para comida, drogas e álcool.
Julgamos se damos ou não,
Pela apresentação deles em seu palco.

“Este foi convincente”.
“Este realmente vai comprar comida”.
Talvez se comprasse bebida,
Estaria mais uma noite com a gente.

Mas gente como eles,
Não são gente.
Gente como a gente,
É que é gente.

Gente decente.
Que tem o que comer.
Que não precisa pensar em assalto,
Para simplesmente sobreviver.

Minha pele seca arde.
Arde com o calor da noite.
As estrelas me mandam um alarde:
É hora do açoite.

Eu não voltei cedo pra casa.
Eu não voltei inteiramente para mim.
Mas verei o sol nascer.
Talvez ainda haja esperança, enfim.

O último gole foi dado.
O último trago no cigarro também.
Minha órbita foi alterada.
Eu não vou para o além!

Já escrevi sobre isso.
Sobre o além.
Durante um tempo ele me atraiu.
Mas hoje sei que não me convém.

Tenho minha cigana.
Tenho minha entidade.
Nada disso é de verdade.
É só uma realidade profana.

Me liberto.
Arrebento as algemas.
Hoje tomo controle,
Do meu demônio de alma gêmea.