sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

O escolhido da estrada


Querido diário,
Hoje é o dia da saída.
Finalmente terei alta!
Será que vou estancar a ferida?

Foram muitos tratamentos.
De eletrochoque, a lobotomia.
Assenti a tudo, que tormento!
Eu sofria, e o médico sorria.

"A dor é necessária!"
Eu ouvia.
"Você sairá daqui um novo homem!"
Mas eu morria.

Foram dois anos de tratamento.
Mas eu acho que não funcionou.
Pois meu único momento de acalento,
Foi quando ele o esfaqueou.

Todos os membros do médico,
Ele retirou.
E quando a cova foi fechada,
Tudo mudou.

Percebi que não sou um doente.
Apenas mal compreendido.
Não entendem a arte em minha mente.
Me vêem como um louco fudido.

Mas não sou um monstro!
Nunca matei ninguém!
Meus pais, esposa e filhos...
Ele os fez de refém!

Disseram que picotei minha esposa.
Olha como isso soa horrível?
Disseram que usei o microondas.
Que ela ficou irreconhecível.

Me chamam de cozinheiro.
Pois fiz sopa dos meus filhos.
Disseram que fui ao chiqueiro,
E alimentei os bichos.

E meus pais?
Por mim eram tão amados!
Disseram que decorei a casa,
Com seus corpos pendurados.

Mas nada disso é verdade.
Eu sei que ele os sequestrou.
Plantou as provas em minha casa,
E em um sanatório me trancou!

Ele não é assim tão mau.
Ele veio me visitar!
E até colocou uma condição,
Para eu com eles, me juntar!

Ele me passou todo o plano.
Só assim, ele pode se redimir.
"Entre na sala de medicamentos,
E tome tudo, até a visão sumir"

"O resto, farei eu.
Pode ficar tranquilo.
Você só vai acordar,
E tudo estará resolvido."

Agora o médico está enterrado.
Mereceu, totalmente dilacerado.
Não deu um diagnóstico de verdade.
Transtorno de personalidade?

Porque não acreditam na minha versão?
Porque insistem em insanidade?
Foi ele que entrou no meu coração!
E roubou toda a ingenuidade!

Para completar o tratamento,
É só tomar mais um remédio,
Sair a noite, no relento,
E acabar com o tédio.

Eles estão vivos...
Disso eu tenho certeza.
Ele me jurou!
Só preciso agir com frieza.

Então os engoli.
A visão ficou turva.
De repente, eu sumi.
Acordei sentado, em uma curva.

Em uma estrada desconhecida.
Sem nenhuma iluminação.
Meu avental, ensopado!
E não era água não...

No meu bolso, tinha uma lanterna.
Acendi e claro, vi o pior.
Dez corpos, estirados no chão.
E eu banhado em sangue e suor.

Todos estavam desfigurados.
Todos os membros, espalhados.
Não se sabia o que era de quem.
Ele os libertou dos pecados!

Olhei para a minha mão,
E lá estava a faca ensanguentada.
Finalmente, eu entendi minha condição!
Sou o escolhido da estrada.

Para pegar os navegantes.
E livrá-los do sofrimento.
Viver é agonizante!
Sou apenas o mensageiro.

Olhei novamente para a faca.
E sabia exatamente o que fazer.
Minha missão estava completa.
Agora meu descanso. Fiz por merecer!

Agora são 3h00 da manhã.
E para mim, não haverá amanhã.
Lentamente cortarei minha garganta.
E serei levado ao céu pela Santa.

Acharão minha carta,
E serei manchete de jornal.
Mais um louco que se mata.
Para eles, isso é tão normal...